sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Notícias da Sofia, da mamã e da tartaruga

Um dia uma menina chamada Sofia completou cinco anos. E nesse mesmo dia uma fada madrinha, de seu nome Paula, ofereceu à menina uma tartaruga, verde, verdinha cor dos prados no despontar da primavera.

A essa tartaruga, que tinha o hábito de levantar-se do pequeno aquário em forma de coração, decorado com uma palmeira à sua medida, Sofia chamou “Fifi”.

Apenas um dia depois da tartaruga chegar à casa da menina e da mãe, não ainda recuperada do jet leg que foi o transtorno do transporte de uma loja de animais até à dita casa, envolta em papel de embrulho e dentro de um caixote, a menina insistiu em levar a tartaruga a passear até à casa do pai.

No reboliço que foi a viagem – Cartaxo – Azambuja – a tartaruga sofreu de amuos, traumas, medos, enjoos e virou-se de carapaça ao contrário no fundo do aquário assustando a menina que prometeu não mais levar a tartaruga em embalos de viagens “todo o terreno”.

A tartaruga está, desde então e para sempre, na imagem da menina.

E mesmo num dia mais triste quando a mãe, numa crise existencial, pediu à menina desculpas pelo transtorno que é ter a menina que movimentar-se entre duas casas, que no fundo são suas, respondeu, depois de pensar um bocadinho:

“Não faz mal. Sabes, eu sou uma criança. Não sou uma tartaruga”.

Abraçaram-se e dormiram juntas. Mas sem a tartaruga...

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Às vezes sou árvore tranquila

Às vezes sou árvore tranquila
Doce embalo ao sabor do vento
Raízes fecundas, olhar atento

Outras vezes rasgo nuvens
Sou o sol - sobre o mar imenso.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Admiro os apaixonados


Admiro os apaixonados,
Aqueles que na passagem efémera pela palete agridoce da vida
Se entregam, corpo e alma, à desventura de amar.

Admiro ainda mais os vencedores dessa batalha
Que é adormecer, nessa caminhada, o lado obscuro do coração e fazer dele almofada

Que serão os outros? Borboletas multicolores?
Bichos que de tanto amar o amor espantam? Seres de encantar a solidão?
O meu amor terminou, mas não a minha paixão.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

A primeira flor

Transplantei a primeira flor
Botão de rosa amargurado
De vermelho pálido pintado

Não procurei chuva de prata
Enterrá-la em vasos de lata?
Mil vezes bocas de leão!

Que hei-de fazer?
Diz-me tu, oh homem que regas!
[E esse segredo carregas]

Bebericam-te as pontas dos dedos
Essas flores viçosas
Como se lhe oferecesses a vida.

Que hei-de fazer?
Se o caule não ficou bem profundo?
Se a raiz solta não a fizer vingar?

Um ramo de gardénias
Te entregarei
A ti que és rei

Enquanto não - parto à procura dos jacintos
Que tingem os rios
Mancha azul num mar de tangos

Transplantei a primeira flor
Roseira brava à procura do amor
Mas não do primeiro.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

'Beija-me como se não houvesse amanhã'

'Beija-me como se não houvesse amanhã'

É um vidro rasgado
na casa de banho em limpeza
de um velho armazém do Chiado.

No dia dos namorados - rosas vermelhas
Na 'down town lisboeta' não escapa nem o forreta.

Não é dia de folga para a Olga,
as tardes são passadas a lavar escadas.

Rosas vermelhas e turistas
E a rapariga passou sem dar nas vistas.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Pensão Rossio Parque

Na Pensão Rossio Parque as escadas são forradas de vermelho cetim.
Rangem ao passar das meias solas do Sr. Joaquim.
Duas estrelas e meia no frontão; um jardim.

Pensão ligeiramente anacrónica, com chuveiro e estores de correr.
Não corre quem não pode. E está trancado no quarto do fundo [um frenesim].

Pequeno-almoço com sumo de laranja amarga.
E um travo a licor beirão
Que traz a inquilina do rés-do-chão.